September 22, 2024

‘Não aceitamos a sanha de uma tentativa de golpismo’, diz presidente da UNE

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A presidente da União Nacional dos Estudantes (UNE), Bruna Brezzaz, disse que não pode mais haver espaço para o autoritarismo no Brasil. Ela fez a declaração no ato em defesa da democracia e do processo eleitoral, na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (FDUSP), no centro da capital paulista, na manhã desta quinta-feira (11). 

“Em um país como o Brasil não pode haver mais espaço para autoritarismo. Reitero nosso compromisso em lutar pelo Estado Democrático de Direito que atravesse desafio de superar desigualdades sociais e econômicas”, afirmou Bruna Brezzaz, no Largo de São Francisco da  FDUSP, onde representantes da sociedade civil e empresários estão presentes para leitura de duas cartas pela democracia.

Brezzaz lembrou que a UNE mobilizou milhares pela redemocratização do país e lutou contra a ditadura militar (1964-1985). “Não aceitamos tentativas de golpismo que flertam com o esgoto mais sombrio da nossa história. Acreditamos na força do nosso povo e na educação como motor chave da sociedade”, disse a líder estudantil, defendendo também uma sociedade livre de racismo, machismo e desigualdade.

Antes, grandes empresários, sindicalistas e políticos adversários se uniram em defesa da democracia e do processo eleitoral, em ato no Salão Nobre da FDUSP. 

A data foi escolhida por marcar o aniversário da criação dos cursos de direito no Brasil – em 11 de agosto de 1827, foi promulgada a lei que criou os primeiros cursos jurídicos do país, em São Paulo e Olinda – e coincide com a leitura de um manifesto também elaborado no Largo São Francisco e lido em 11 de agosto de 1977, para denunciar a ditadura militar, que subtraiu direitos e matou opositores do regime.

No caso da “Carta às Brasileiras e aos Brasileiros em Defesa do Estado Democrático de Direito”, que foi organizada por ex-alunos da FDUSP em 2022, ela havia recebido mais de 940 mil assinaturas até as 11h desta quinta, com adesão de professores, alunos, ex-ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), artistas, banqueiros, empresários, candidatos à Presidência da República, instituições de diversos setores e profissionais das mais variadas atividades.

O evento organizado pela FDUSP nesta quinta teve dois momentos. Primeiro, a leitura do manifesto “Em Defesa da Democracia e da Justiça”, no salão nobre da instituição de ensino superior. Em uma união inusitada, as oito maiores centrais do país assinaram a carta, capitaneada pela Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp).

Momento inédito em que capital e trabalho se juntam, diz ex-ministro 

O clima do encontro dos representantes dessas entidades foi de união entre “capital e trabalho”, como destacou o ex-ministro da Justiça e um dos idealizadores da carta de 1977, José Carlos Dias. 

“Hoje é um momento inédito em que capital e trabalho se juntam em defesa da democracia. Estamos celebrando o hino da democracia”, disse. Ele foi o responsável por ler o manifesto articulado pela Fiesp.

Paulistano formado pela Faculdade de Direito da USP, José Carlos Dias é presidente da Comissão Arns. Ele atuou na defesa de presos políticos durante a ditadura militar. Em 1980 foi preso pelo regime por acompanhar metalúrgicos do ABC em greves. Depois, defendeu Luiz Inácio Lula da Silva quando ele era líder daquela categoria. Ainda foi secretário da Justiça de SP entre 1983 e 1986 e ministro da Justiça no governo de Fernando Henrique Cardoso, em 1999 e 2000

Após o manifesto “Em Defesa da Democracia e da Justiça”, foi lida a “Carta às Brasileiras e aos Brasileiros em Defesa do Estado Democrático de Direito”, no Pátio das Arcadas, também no Largo São Francisco.

Apenas pessoas convidadas puderam participar dos eventos na USP, mas, na área externa da faculdade, foram instalados telões para que o público pudesse acompanhá-los. Dentro, havia cerca de 1.200 pessoas. Fora, eram mais de 5 mil, segundo os organizadores. Nem a chuva afastou o público externo.

Reitor da USP lamenta que sociedade está lutando contra retrocessos, em vez de pensar no futuro

As atividades em defesa do estado democrático de direito, na Universidade de São Paulo, começaram às 10h, com a execução do Hino Nacional. Em seguida vieram os discursos de representantes de vários segmentos da sociedade.

O primeiro a falar foi o reitor da USP, Carlos Gilberto Carlotti Junior. Ele defendeu eleições livres e disse que a universidade é o oposto do autoritarismo. Também lamentou que a sociedade brasileira esteja lutando contra retrocessos, em vez de pensar no futuro.

“Após 200 anos de Independência do Brasil, deveríamos estar pensando em nosso futuro, em como resolver problemas graves. Mas estamos voltados a impedir retrocessos.”

Carlotti Junior defendeu o papel da universidade, da pesquisa e do conhecimento e lembrou as 47 pessoas ligadas à USP que foram vítimas da ditadura. “Não esquecemos e não esqueceremos”, ressaltou.

Ex-presidente do BC, Armínio Fraga se emocionou e falou em “situação esdrúxula”

Terceiro a falar, o economista Armínio Fraga, ex-presidente do Banco Central, se emocionou ao microfone. Ele destacou que o movimento reúne um “grupo tão diverso, que tantas vezes no passado lutou em polos opostos”, mas que hoje luta unido pela democracia. 

“Falo com toda a convicção de quem pensa 24 horas por dia no nosso país que nós não temos outro caminho que não o da liberdade, da democracia, da Justiça”, disse Fraga. “As sociedades mais prósperas do planeta são todas democracias”, completou.

Armínio Fraga chamou a situação atual de esdrúxula. “É uma situação esdrúxula essa, mas toda nossa energia, toda nossa coragem tem que ficar neste momento concentrada em salvar o que foi conquistado ao longo dos anos, que é a base para o nosso futuro.”

“Temos uma Constituição. Tudo está dito lá. Respeitemos”, ressaltou empresário

Sócio do grupo Klabin, o empresário Horácio Lafer Piva falou após a presidente da CUT-SP. Ele, que é presidente do conselho deliberativo da Indústria Brasileira de Árvores (IBÁ), reforçou o compromisso das entidades com a democracia e respeito ao meio ambiente. A organização foi uma das 107 que assinaram a carta “Em Defesa da Democracia e da Justiça”, da Fiesp.

Horácio Piva, que também já presidiu a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo e tem afirmado que as cartas são como alertas da sociedade ante as ameaças à democracia, reforçou a necessidade de crescimento econômico com respeito ao meio ambiente.

“Todos que estão aqui hoje lutam contra a apatia, lutam contra o populismo, as ameaças. Lutam contra os riscos de deixar de lado o melhor de nós mesmos”, afirmou. “Temos uma Constituição. Tudo está dito lá. Respeitemos”, emendou.

Piva ainda ressaltou a mobilização da sociedade na data. “Tudo pelo Estado de Direito, tudo pela democracia. Sigamos juntos”, concluiu.

Não queremos sentir saudade da nossa democracia, diz presidente da OAB-SP

A presidente da Ordem dos Advogados do Brasil  em São Paulo (OAB-SP), Patrícia Vanzolini, disse ser necessário relembrar a luta contra a ditadura militar (1964-1985) para evitar a perda de direitos hoje. “Pessoas morreram ou tiveram que sair do país para que nós tivéssemos o que nós temos hoje”, destacou.

Ela afirmou que a sociedade pode “contar” com a advocacia e a OAB-SP para defender a democracia. Vanzolini falou ainda em canto sedutor do autoritarismo e que ele encontra espaço naqueles que não viveram sem democracia. 

“Hoje, a hora é de reafirmação. É a hora de falar para gerações mais novas, para que os nativos da democracia, que cresceram sem o autoritarismo, percebam e valorizem tudo o que nós temos”, disse. “Só se sente falta de algo ou de alguém quem já perdeu. Afinal, a saudade é a presença dos ausentes. Não queremos sentir saudade da nossa democracia, por isso não podemos sequer flertar com a sua ausência”, seguiu. “Democracia para o corpo social é como oxigênio para o corpo humano, nós não vemos não sentimos o oxigênio, mas percebemos sua importância quando falta, e sem ele ficamos asfixiados”, finalizou.

“Enquanto houver racismo, não haverá democracia”, disse representante da movimento negro

A representante da Coalizão Negra Por Direitos (Uneafro), Beatriz Lourenço do Nascimento, leu o manifesto do movimento e pediu o compromisso das outras iniciativas pela democracia com o combate ao racismo. 

“Pratiquem o que discursam! O Brasil é um país em dívida com a população negra”, afirmou. “Hoje lutamos por uma verdadeira democracia. Enquanto houver racismo, não haverá democracia”, completou.

Empresários e sindicalistas fazem votação juntos a favor da democracia

“Não podemos admitir que o presidente da República não respeite a Constituição que ele jurou respeitar (…) e que setores da sociedade queiram esse retrocesso”— afirmou Miguel Torres, que é presidente da Força Sindical. Ele convocou os participantes do ato a cerrarem os punhos e levantarem as mãos em defesa da democracia.

Sindicalista diz que manifesto em defesa à democracia não é uma “cartinha”

O secretário-geral da União Geral dos Trabalhadores (UGT), Francisco Canindé Pegado, disse que o manifesto em defesa à democracia não é uma “cartinha” como o presidente Jair Bolsonaro (PL) havia dito.

“Esse documento não é uma cartinha como alguém insinua. Respeitem essa carta. É um documento que para nós é uma peça de artilharia de longo alcance. Nossa caminhada não pode ser interrompida por ninguém”, rebateu.

Bolsonaro, que ataca sistema eleitoral, chama documento de “cartinha”

O presidente Jair Bolsonaro tem se referido ao documento como “cartinha”. O termo foi usado por ele, por exemplo, durante um almoço com representantes da Federação Brasileira de Bancos (Febraban), na segunda-feira (8).

Bolsonaro afirmou que o objetivo do manifesto é “voltar o país às mãos dos que fizeram uma ofensa conosco”, em referência aos governos do PT. “Quem quer ser democrata não tem que assinar cartinha não. Todo mundo, se eu mandar assinar que sou honesto, todo mundo vai assinar que é honesto. Democracia tem que sentir o que a pessoa está fazendo”, disse.

Ele ainda garantiu que não assinaria a carta, “por causas além da política”. “É melhor um democrata na corrupção do que um honesto em um regime forte? Qual regime forte é meu? Me aponte uma palavra minha contra a democracia”, questionou.

O documento defende o sistema eleitoral e as urnas eletrônicas, sob ataque de Bolsonaro. “Nossas eleições com o processo eletrônico de apuração têm servido de exemplo no mundo. Tivemos várias alternâncias de poder com respeito aos resultados das urnas e transição republicana de governo. As urnas eletrônicas revelaram-se seguras e confiáveis, assim como a Justiça Eleitoral”, diz trecho do documento que será lido nesta quinta. (Com Folhapress e Estadão Conteúdo)

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